segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Pensamentos Secretos

Autor: David Lodge
Título original: Thinks 
Editora: Edições Asa
Páginas: 368
ISBN: 9789724129228
Tradução: Ana Maria Campos  Ferreira Chaves

Sinopse: Ralph Messenger é um homem que sabe o que quer. Prestes a atingir os cinquenta anos, tem motivos para se sentir satisfeito: na qualidade de director do prestigiado Centro de Ciências Cognitivas «Holt Belling» da Universidade de Gloucester, é amplamente solicitado como referência incontornável no desenvolvimento da inteligência artificial e no estudo da consciência - «a última fronteira da investigação científica»; e vive em grande estilo, amplamente financiado pela fortuna da mulher, Carrie. Conhecido pela sua faceta de mulherengo, Ralph tem um acordo tácito com Carrie: a «normalidade» é mantida desde que as suas aventuras não invadam o território dela. Quando encontra Helen Reed, uma escritora famosa ainda a viver a dor da morte súbita do marido, Ralph sente-se imediatamente atraído por ela. Fascinada e estimulada por uma personalidade e uma visão do mundo radicalmente opostas às suas, Helen deixa-se seduzir pela ousadia dos avanços de Ralph, mas os seus princípios morais levam-na a resistir. Porém, as reservas existentes são pulverizadas por uma série de acontecimentos e descobertas que confirmam de forma dramática toda a verdade contida numa frase de Ralph: «Nunca podemos saber ao certo o que a outra pessoa pensa». 

Opinião: Ou se gosta ou não de David Lodge. Já li alguns livros deste autor (A Troca, O Mundo é Pequeno e Duras Verdades, todos publicados pelas Edições ASA), tenho outros tantos em lista de espera na estante, mas imediatamente depois de ler fico com a sensação de que tão cedo não volto a "repetir a dose". No entanto, acabo sempre por voltar a ler Lodge - não sei se pela ousadia das temáticas (as questões sexuais, a infidelidade e o facto de o fio condutor que rege a vida das personagens de Lodge ser, invariavelmente, a atracção erótica inevitável e explosiva) ou se pelo humor acutilante que tão bem caracteriza o seu estilo.

A história é contada a três vozes. Ralph, um prestigiado académico muito mulherengo, e Helen, uma escritora que se afasta de Londres para dar aulas de literatura, respectivamente, ao gravador e num diário, registam os seus pensamentos mais íntimos, enquanto um terceiro narrador dá coerência ao resto das interacções que vão surgindo. 
A ideia subjacente ao livro é muito feliz. Por um lado, Lodge reflecte acerca da consciência, uma vez que Ralph dirige um centro universitário vocacionado para a Ciência Cognitiva; por outro, somos confrontado com uma curiosidade que nunca poderá ser satisfeita: a de saber exactamente em que é que o outro pensa (pois por muito que ele nos diga, a informação nunca nos chega em estado puro, antes codificada pelo emissor, que durante esse processo a intelectualizou e, em última análise, a deturpou).

Parece mais complicado do que realmente é, pois Lodge não se perde nos meandros do estudo científico da mente. Antes pelo contrário, oferece uma narrativa muitas vezes hilariante, por vezes surreal e caricata.
Subjacente a todo o livro está o mundo universitário, tantas vezes analisado por Lodge, e a crítica às conferências e encontros internacionais que reúnem uma elite académica mais interessada em affairs e numa vida boémia do que na transmissão do conhecimento e dos frutos das suas investigações. 
Como já referi, outro ponto forte é a questão sexual. Irá Ralph conseguir seduzir Helen, cujo estado civil a levou a já não acreditar no amor? Terá futuro esta relação extraconjugal? Spoilers à parte, neste capítulo, Lodge apoia-se numa fórmula já revisitada e a partir de certa altura o que está em causa é apenas descobrir se Ralph abandona ou não o seu casamento pela «outra».
Por fim, é de salientar que acaba por ser muito interessante a discussão entre «ciência» e «arte». Somos apenas um conjunto de neurónios? Será a consciência fruto de processos mecanicistas e quantificáveis ou existe uma espécie de «alma» humana? Lodge também discute que contributos poderá dar a literatura à Ciência Cognitiva e se os qualia, isto é, as qualidades subjectivas das experiências mentais, realmente existem.
Classificação: Muito Bom (8/10)

2 comentários:

Célia disse...

Li há pouco tempo "Vida em Surdina" e gostei muito. Fiquei com imensa curiosidade por conhecer mais deste autor, que parece ter um estilo tão peculiar, e parece-me que este será uma boa aposta.

JM disse...

Também tenho esse em lista de espera (e mais uns 4 ou 5 sem exagero :P). O truque é esperar uns meses entre leituras. Ler dois de seguida é ficar com má impressão no fim.