quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Entrevista a Valerio Massimo Manfredi, autor de "O Exército Perdido" (JN)



Valerio Massimo Manfredi, autor da aclamada trilogia sobre Alexandre, o Grande, de volta com "O exército perdido".
Com a trilogia sobre Alexandre, o Grande, entretanto adaptada ao cinema, provou que os livros com fundo histórico também podem ser "best-sellers".
Sem abdicar da carreira de professor e arqueólogo, o italiano Valerio Massimo Manfredi construiu uma obra, já publicada em 38 países, que entrelaça o rigor dos factos à envolvência emocional apurada. Em "O exército perdido", o autor de "O império dos dragões" parte de um episódio histórico enigmático - o aniquilamento de um exército composto por 10 mil mercenários na Antiga Grécia - para concluir que o caminho para a glória não está apenas reservado aos vencedores.

A credibilidade é o atributo mais importante para um escritor que lida com factos históricos?
A História e a literatura são áreas muito diferentes. A História é a tentativa da Humanidade para criar uma memória comum que possa ser transmitida de geração em geração. Enquanto a literatura é um trabalho de imaginação, na História, temos que provar que tudo o que escrevemos é verdadeiro. A narração de histórias é bem diferente. Foi criada para preencher o vazio entre a nossa mente e a nossa vida, sendo que a primeira é muito mais vasta do que a segunda. Foi por isso que inventámos os épicos, o teatro, o cinema e a televisão. Enquanto a História nos fornece conceitos e transmite ensinamentos, a narração transmite emoções.

É por isso que atribui a mesma importância ao ensaio e à ficção?
O meu novo livro é um ensaio de arqueologia, mas sinto que, se quisesse, poderia ser convertido em romance sem dificuldade. Mas escrever este livro foi tão fascinante como contar uma história. São duas expressões diferentes, mas é a mesma pessoa que as escreve. Quando contamos uma história, esta tem que soar autêntica, pois, caso contrário, não haverá emoção envolvida. Ao lermos a "Odisseia", sabemos que os ciclopes ou as sereias não existem, mas as passagens que os descrevem soam tão fascinantes que nos sentimos a viver outra vida. Sem a "Odisseia", a Humanidade seria mais pobre. A verdade é que precisamos das emoções associadas à narração e dos conhecimentos que caracterizam a História.

Passa longos períodos a investigar em universidades europeias, escavando nas ruínas da História. É a parte mais aborrecida do seu trabalho?
Desconheço o significado da palavra "aborrecimento". Todas as experiências da minha vida têm sido interessantes. Comecei a carreira como investigador e é assim que ainda me defino. São duas maneiras diferentes de viver a minha vida e precisamos de ambas para nos sentirmos completos.

A escrita não é mais apaixonante?
Sim, na medida em que temos que sentir emoção por forma a transmitir estados de alma aos leitores. No entanto, defendo que investigar não é menos profundo do que contar uma história.

As respostas para os problemas actuais podem ser encontradas no passado, conhecendo a História?
O que cria o progresso é a possibilidade de acumulação de conhecimento. Podemos acumular sabedoria e transmiti-la aos nossos filhos. Se eles assimilarem esses conhecimentos, acrescentando novos ensinamentos, estaremos perante o que se designa por civilização. É certo que acontecimentos passados não se reproduzem mimeticamente no presente, mas claro que podemos sempre aprender com as lições da História. Além do mais, pode auxiliar-nos a evitar que cometamos os mesmos erros do passado.

Escrever um livro como "O exército perdido" era um projecto que acalentava há muito?
A pesquisa que deu origem ao livro foi a mais importante da minha vida académica. Procurei narrar a aventura de uma forma emotiva, porque reunia os condimentos para ser um grande livro. 

A longa investigação que precedeu a escrita faz de "O exército perdido" o livro mais recompensador da sua obra?
Qualquer um pode fazer investigação, desde que tenha recebido ensinamentos nesse sentido. Mas isso não faz de qualquer investigador um romancista. Por muito fidedignos que sejamos na transcrição de factos históricos, é preciso ter talento. E isso ou nasce connosco ou não. Tenho livros nos quais tudo é ficção, como "A torre da solidão". Isso não o torna menos verdadeiro aos olhos de quem o lê, porque tentei criar uma narrativa que sugasse o leitor para o centro da história, envolvendo-o. A nossa mente tem a capacidade miraculosa de tornar a ficção como algo verosímil. 

Por que continua a dar aulas apesar de vender milhões?
Não é uma questão de dinheiro. Quando ainda não passava de um jovem professor desconhecido, não era, seguramente, menos feliz do que sou hoje. Tinha menos dinheiro, mas dispunha de mais tempo para ler, viajar, estar com os amigos e namorar...JN

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