quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Duras verdades ou complexos de um pseudo-intelectual?


O que mais aprecio na revista Ler são as colunas de opinião. Estava eu a ler (passo a redundância, mas ela é inevitável) o espaço "O Bem e o Mal" de Jorge Reis-Sá e eis que me deparo com um trecho que me deixou logo um bocadinho mal-disposta pela manhã (em grande parte porque, de imediato, não consegui decidir se Reis-Sá tinha ou não razão):
"O facto de Müller não estar praticamente traduzida em Portugal - como não estava Le Clézio, por exemplo - é que nos deve fazer pensar. Que país é este que edita historietas da Jodi Piocoult e do Nicholas Sparks e se esquece dos verdadeiros escritores? Será preciso um Nobel para que se veja que quem perde somos nós?" (p. 11).
Bem sei que a coluna de Jorge Reis-Sá apresenta sempre os dois lados da questão, mas desta vez não consigo concordar com nenhum. Posto isto, e porque não é meu objectivo criar uma polémica em torno deste assunto, só quero expor aquela que tem sido a máxima pela qual me guio no que trata às (minhas) escolhas literárias: cada um lê aquilo que quer e bem lhe apetece. Lembro-me de há uns anos, aquando do boom dos livros de Margarida Rebelo Pinto (que li, pelo menos um, para poder saber que não queria ler mais), que se dizia que o importante era que os portugueses estavam a ler mais, independentemente do autor que escolhiam. E não é válido? O bom leitor é só aquele que lê os clássicos e os Nobel? Se assim for, então incluo-me no rol dos leitores incultos e obscurecidos que desconheciam por completo Herta Müller, embora deva confessar que a minha existência decorria com perfeita normalidade até esta escritora saltar para as luzes da ribalta intelectual.

Ainda assim (e porque a reflexão de Jorge Reis-Sá surge no final da primeira coluna), de imediato, dei o benefício da dúvida ao cronista, mesmo que a maior parte de nós não admita com ligeireza, ler um clássico ou um Nobel faz-nos sempre sentir mais cultos , embora nem sempre seja a leitura da nossa vida (que interessa se gostámos, se era «maçudo» ou se pura e simplesmente não conseguimos perceber a euforia em torno da coisa?). Já li a minha cota parte de vultos da literatura, mas também os Nicholas Sparks desta vida e não foi por isso que me senti mais pobre. 
O cronista incendiou esta minha reflexão por afirmar "eu só gosto de ler coisas que trazem apensas um prémio". Eu (se bem que no panorama do pseudo-intelectualismo a minha opinião não conta para nada) só gosto de ler coisas que me dêem prazer, com as quais me identifico e que me abstraiam dos problemas do dia-a-dia. Se for Saramago, V. S. Naipaul, Günter Grass ou mesmo Herta Müller (só para nomear alguns, porque não vou percorrer toda a lista de premiados pela Academia Sueca) muito bem; se for um romance de cordel, a Jodi Picoult (que ainda não li), o Nicholas Sparks, a Nora Roberts ou qualquer outro autor menos galardoado também não me importo. Eu gosto é de ler, ponto final.

10 comentários:

Unknown disse...

Olá JM
Obrigada pela visita ao Histórias...
Concordo em absoluto com este post. Amo ler desde que me conheço por gente. Mas sou capaz de ler, com igual prazer, um autor Português, um autor galardoado ou um ilustre desconhecido. E acho que o importante é que cada pessoa leia os livros que se lhe adaptam. O livro certo para a pessoa certa é extremamente importante.
Lembro-me de uma estatistica que diz muito acerca do perfil do leitor "típico": o (maravilhoso) livro "O deus das pequenas coisas" é um dos best-sellers que a malta compra, tem na estante lá em casa mas não lê!!!
Boas leituras
Pat

JM disse...

É precisamente esse o "busílis" da questão... e também de nada serve ter livros a decorar a estante ;)

Célia disse...

Gostei muito de ler o que escreveste e assino por baixo. Pergunto-me se, por acaso, o autor deste artigo já terá lido algum livro da Jodi Picoult ou do Nicholas Sparks. A minha suspeita é que não, o que torna ainda mais incompreensível afirmar que não são verdadeiros escritores (não é dito literalmente, mas está implícito).
Ainda ontem comentava no twitter, a propósito de uma crítica ao novo livro do Dan Brown que li, escrita por um crítico literário profissional, e que como deves imaginar deu uma nota mais que negativa ao livro, que me dá impressão que quando estas pessoas lêem livros comerciais, já vão com uma ideia pré-concebida e com a intenção de dizer mal. O livro se calhar até é mau, mas ler estas opiniões torna-se aborrecido de tão previsível.
É por isso que não compro a LER, a Os Meus Livros ou outra revista qualquer do género. Porque esquecem que a leitura é diversidade e que deviam tentar cobrir o mais possível todos os tipos de livros. Porque está sempre implícito aquele pseudo-intelectualismos do "o que nós lemos é que é bom, o resto é lixo". Por isso, prefiro mil vezes ler opiniões de amadores ;)

JM disse...

Foi por essa e várias outras razões (entre as quais o exorcismo das leituras que faço, porque deitar cá para fora o que um livro nos fez sentir torna-o muito mais real aos nossos olhos) que me lancei na aventura de construir este blog. Sou assinante da LER, razão pela qual folheio assiduamente a revista, mas cada vez mais sinto que os ditos críticos literários se distanciam mais dos leitores. A leitura é diversidade, como bem advertiste, mas é também algo de pessoal e intransmissível. Há já algum tempo que deixei de me influenciar pela crítica da camada dita intelectual; mas mais do que uma vez já dei por mim a folhear livros recomendados pelos ditos amadores, cujas impressões, por serem tão honestas e despejadas de preconceitos, me levam a ter em conta determinados livros que me passariam ao lado.
Em suma, por acaso não escrevi nesta divagação, mas acrescento: bendita blogosfera.

Bjs e obrigada pelo teu comentário :)**

Nuno Chaves disse...

olá Joana, uma vez mais, é sempre um prazer recebe-la no pagina a pagina, as suas opiniões e criticas sao sempre bem vindas, construtivas e interssantes. sobre este artigo, a minha critica não é sobre o livro em si, eu não posso criticar uma obra que não li. (e não vou ler) a critica é em relação a postura do Sr. Saramago nesta situação. que eu não gostei.
ja li alguns livros de Saramago tenho 34 anos e fui obrigado literalmente a ler o Memorial do Convento impingido pela escola, (bons tempos em que nos recomendavam Eça), portanto em relação à escrita do Nobel, tenho uma opinião própria, formada e claro pessoal. li O Evangelho Segundo Jesus Cristo, ensaio sobre a Cegueira e claro está Todos os Nomes, que até achei a ideia bem original, embora na práctica, não tenha (para mim) resultado. em relação à escrita, não gosto e não tem a ver com o facto de o Nobel, quebrar todas as regras de gramática e de pontuação, é o seu estilo e ponto final.
tem a ver com o facto de que (a minha muito pequena massa-cinzenta) não conseguir atingir a mensagem das suas obras. definitavente não consigo, nem quero ler JS. tenho pena da minha filha quando tiver de ser obrigada a ler este senhor na escola. espero então que ela o entenda e que goste. a diferença é aquilo que nos distingue, os nossos gostos e opiniões próprias.
obrigado Joana pelo seu comentário até breve.


P.S. em relação a este seu artigo, não podia concoradr mais, temos de ler primeiro e criticar depois. o centro da questão é quando não se gosta mesmo. por se ter tido más experiencias anteriores, o que não quer dizer que não nos possamos surpreender com outro livro, ja me aconteceu.
nuno.

JM disse...

Assim que estalou a dita “polémica” em torno das declarações de JS reagi (http://favouritereadings.blogspot.com/2009/10/as-contradicoes-de-saramago.html), puxando mais a “brasa à minha sardinha” (no que à História diz respeito) – embora concorde plenamente com o facto de referir que ninguém tem o direito de ofender e maltratar (nomeadamente na praça dita pública) o que quer que seja.
Aquando do episódio das leituras escolares obrigatórias, escolheu-se Virgílio Ferreira ao invés de JS, razão pela qual li avidamente a “Aparição” e não me cruzei com o “Memorial do Convento”. Abstenho-me, pois, de comentários relativamente à Obra de Saramago, pois não tenho medidas de comparação.
Relativamente ao meu comentário, só quis expressar o que tenho sentido ao desfolhar “Caim” – se o leitor se abstrair de toda a polémica e de enfabulação que está em causa e puser de lado, nem que seja apenas durante a leitura, convicções políticas e, nomeadamente, religiosas, então parece-me possível, no mínimo, divertir-se. Porque garanto-lhe, e pode nem sequer ter sido essa a intenção de JS, mas há trechos que lhe arrancariam um sorriso, nem que seja só pelas «imagens» que são apresentadas.
Já decidi que, eventualmente, irei dar uma oportunidade ao “Evangelho Segundo Jesus Cristo”, que na época em que foi publicado não causou, nem de perto nem de longe, toda esta celeuma, que, propositadamente, ou não, acabou por catapultar “Caim” para o top dos livros mais vendidos, uma proeza que desconfio que Saramago não conseguiria arquitectar de outro modo.
Cumprimentos!

disse...

Oi!
O que seria um pseudo-intelectual?
Tem um selo lá no blog pra você, está junto com a série Jack Farrell no final do post!Passa lá!
Beijos! =)

Unknown disse...

Pessoalmente, faço um esforço por ler clássicos. Porque a vida não chega para ler tudo o que merecia ser lido.
No entanto, a opinião de Jorge Reis Sá padece de um complexo elitista lamentável. Se não vale a pena ler os não premiados, na sua opinião não valeria a pena publicar mais nada. Ou seja, tudo o resto é inútil. Condenar-se-ia à morte um génio como Paul Auster, por exemplo?
Além disso quem fez de Cervantes um clássico? Ou Victor Hugo? Ou Flaubert? Foram os prémios? Quais prémios? Ou não terão sido os leitores? Leitores como os de Sparks ou Picoult!
Sendo directo: trata-se de uma opinião desprezível. Lamentável.

JM disse...

Caro Manuel,
Eu também faço esse esforço, mas por vezes também me apetece fazer uma excursão pelos meandros menos galardoados da literatura (e não me tenho propriamente arrependido). Esse complexo elitista de que fala tem, na minha humilde opinião, contagiado grande parte da crítica literária, o que é uma pena, pois, como já referi, cada vez me sinto mais próxima das críticas do leitor/amador e mais distante dos (muitas vezes auto-intitulados) especialistas.

PS: Paul Auster, bem como outros autores negligenciados, bem merecia ser mais galardoado e reconhecido do que realmente é!

RB disse...

Epá, já ando farto disto! Estas questões de ler o q é "mais correcto" ou "mais culto", assemelha-se ao ver "o filme que mais «puxa» por nós"!A literatura serve para o entretenimento de uma pessoa - salvo livros técnicos de uma especialidade, que, por mais absurdo que possa parecer, também podem entreter. Portanto, devemos ler aquilo que mais gostamos ou com o que mais nos identificamos! Que se lixe este tipo de críticas!